domingo, 6 de março de 2011

Entre a sorte e o destino, fico com a responsabilidade

Essa semana um diretor da Novacap morreu aqui em Brasília, por consequência dos traumas causados pelo impacto de uma pedra de aproximadamente 3kg. O fato em si é brutal. Mas também revoltante. A pedra em questão caiu de um viaduto, enquanto o carro passava por baixo. A vítima, que estava no banco do passageiro, foi levada até o hospital pelo amigo, que estava no banco do motorista e também se feriu. E, como fatos revoltantes normalmente vêm acompanhados de uma cadeia de absurdos, o viaduto supracitado não fica numa rodovia fantasma, de um lugar esquecido, por onde nunca passa alguém. A estrada em questão é a Epia (Estrada Parque Industria e Abastecimento), via de tráfego intenso a qualquer horário do dia. Uma das obras entregues pelo governador Arruda (aquele, que tornou Brasília vergonhosamente famosa e com a moral completamente abalada, bem na véspera do cinquentenário da cidade). E, assim como seria compreensível em uma rodovia fantasma, de um lugar esquecido, por onde nunca passa alguém, o viaduto da Epia provavelmente há anos não sabe o que é manutenção. Pelo menos uma manutenção de vergonha.

Então, deixando um pouco de lado os repetitivos temas da corrupção, do desvio de dinheiro e da falta de amor ao próximo que assolam muitos de nossos semelhantes, volto ao tema da vida brutalmente interrompida, num percurso à toa, no tocar da vida, por uma pedra que despenca de um viaduto sem manutenção. Proponho, então, o tema da responsabilidade de todos nós, em cada coisa que fazemos.

Gostamos às vezes de falar em destino, em acaso, em azar, em sorte. É melhor falarmos de responsabilidade. Sabe por quê? Porque responsabilidade é palpável, é mensurável. Eu, ou qualquer um de nós, conseguimos avaliar a responsabilidade de quem deveria ter executado a manutenção daqueles e de tantos outros viadutos (por exemplo); daqueles que deveriam ter considerado isso uma prioridade, e contratado a empresa que executaria o serviço. Também, daquele que deveria ter disponibilizado uma faixa do orçamento para tal objetivo – zelando pelo dinheiro público e cuidando para que os recursos fossem aplicados devidamente e sem desvios. Por fim, porque não falar da responsabilidade daqueles que escolheram os representantes que vão gerir todo esse processo, estabelecer prioridades e nomear os responsáveis por áreas tão importantes como a infra-estrutura, a saúde ou a educação?

Algumas semanas atrás, para espanto de muitos que usam a lindíssima Ponte JK – seja como atalho, ou mesmo como uma bela alternativa, para ir e vir – os acessos a ela foram interditados. Aos poucos, uma via foi liberada, ainda assim apenas para carros de passeio, a uma velocidade máxima de 40km por hora. A dedução mais rápida foi a de que havia tido um acidente, provavelmente com vítima, quiçá envolvendo um carro oficial – neste caso, todas as fontes de burocracia e gravidade estariam aliadas, o que justificaria aquele transtorno em Brasília durante toda uma tarde. O absurdo (mais uma vez revoltante) superou todas as expectativas. A lindíssima Ponte JK estava com uma rachadura. De “uma chave” de largura, como dizem na minha terra. Engenheiros, técnicos, políticos, assessores de imprensa, bombeiros e até acadêmicos foram chamados ao local. As conjecturas eram muitas. Mas, no final das contas, a resposta – absurda, revoltante – foi a de que, após oito anos inaugurada, a Ponte JK (lindíssima) nunca havia passado por uma manutenção séria. Onde estava o plano de preservação da Ponte? Em uma gaveta, esperando por algum trâmite, alguma burocracia, ou simplesmente aguardando ser lebrada na próxima faxina que contemplasse a bendita gaveta. Fico pensando o que diria JK, o ilustre homenageado, o homem de tantas obras...

Por baixo dos nossos viadutos e pontes passam todos os dias ricos e pobres. Ônibus lotados, vans piratas, veículos escolares, carros populares e de luxo, além dos carros oficiais. Sem falar dos pedestres, dos ciclistas. A falta de responsabilidade, neste caso (diferente de muitos outros), não privilegia essa ou aquela classe social. Brasília, famosa por suas tesourinhas, suas pontes e viadutos, não pode benzer-se a cada trajeto, à espera de sorte, destino ou qualquer coisa. Brasília precisa contar com a responsabilidade. E isso inclui a mim, a todos nós. Se as pessoas que deveriam zelar pelo nosso chão estão engavetando prioridades, cabe a nós pensar quem possibilitou a essas pessoas estar ali. Do dito popular, podemos tirar uma grande lição: “cada um em seu quadrado”. A cada um de nós cabe uma parcela da responsabilidade pela qualidade das nossas vidas e de nossos semelhantes. Desde o voto responsável, até o exercício pleno de uma função pública, todos somos responsáveis pela forma como desenhamos o presente e o futuro.

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